Ninguém acreditou quando aquele vulto atravessou a porta da sala, mirando a todos, com lágrimas nos olhos.
Frederico, cadavérico, com voz fraca e rouca, lembrava mais um fantasma vagando e buscando abrigo. Era emocionante vê-lo, mas abraça-lo verdadeiramente não foi tarefa fácil para Ruth e principalmente para Carlota. Após 10 anos, todos eram pessoas diferentes, que precisavam de tempo para se conhecerem novamente.
Os primeiros dias se seguiram e todos os familiares, amigos e vizinhos queriam abraça-lo e ouvir suas histórias de como conseguira sobreviver aos horrores da guerra por tanto tempo.
Eram historias tais como :
" de quando chegou a Breslau, na Polônia, e encontrou a casa de sua mãe em ruínas "
" de quando teve que deixar para trás o violino que havia prometido trazer a Erica "
" da mãe e filha, alemães, que famintas, e sem terem nada para comer, se escondiam nos arbustos na beira da linha do trem, na esperança de recolher algum pedaço de sanduíche atirado por soldados "
" de como se escondia abaixo dos cadáveres nas trincheiras, para não ser baleado"
" de como usava a própria urina para curar seus ferimentos"
" de como esperava a morte a cada bombardeio "
" de como arriscou a vida, escondendo a sua aliança embaixo da língua, numa revista quando o prenderam nos campos de concentração na Rússia "
10 anos de um homem que nunca quis ser herói, sua vitória foi sobreviver para poder voltar para sua família.
Logo apos as primeiras semanas, os traumas e problemas de saúde ficaram evidentes. Ele brigava ao ver cascas de batatas sendo jogadas fora, pois foram a base da sua alimentação por anos. Se encolhia nos cantos da casa, ou embaixo dos móveis, quando ouvia algum barulho de avião ou fogos de artifícios. Estava também desnutrido, tinha frequentes pesadelos e dormir não era tarefa fácil.
Apos algum tempo, com apoio de médicos, amigos e familiares, ele retornou ao trabalho numa gráfica, mas o convívio familiar ainda era muito difícil. A vida conjugal nunca mais foi a mesma. Carlota via seus sonhos, de voltar a Europa, morrerem e ela se tornou uma pessoa triste e calada. O relacionamento entre ele e Ruth também era distante, e ela via em Werner a figura de seu verdadeiro pai.
Mas Frederico encontrava apoio em Erica e na família de Werner e Mercedes, que sempre o apoiavam e o enchiam de carinho.
O contato, com os poucos parentes sobreviventes na Alemanha, era feito por cartas, que mostravam a triste realidade de reconstruir um pais do zero.