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O porque do blog

A ideia de criar esse blog era antiga, mas ganhou forca numa aula de inglês, aqui em Vancouver, quando uma professora lamentou não saber quase nada sobre sua família de imigrantes italianos.

Da mesma forma, lamentei saber pouco sobre meus familiares, também imigrantes, e me perguntei: " o que estou fazendo para que meus descendentes saibam um pouco da historia da nossa família ? ", " por que deixar que a historia seja contada aos meus netos, se posso escreve-la em detalhes? ".

Se você quiser saber um pouco sobre imigração, cultura, politica e sociedade desde o inicio do século XX, embarque nessa viagem. Seja bem-vindo.

Abraços

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

O difícil recomeço

Ninguém acreditou quando aquele vulto atravessou a porta da sala, mirando a todos, com lágrimas nos olhos.
Frederico, cadavérico, com voz fraca e rouca, lembrava mais um fantasma vagando e buscando abrigo. Era emocionante vê-lo, mas abraça-lo verdadeiramente não foi tarefa fácil para Ruth e principalmente para Carlota. Após 10 anos, todos eram pessoas diferentes, que precisavam de tempo para se conhecerem novamente.
Os primeiros dias se seguiram e todos os familiares, amigos e vizinhos queriam abraça-lo e ouvir suas histórias de como conseguira sobreviver aos horrores da guerra por tanto tempo.
Eram historias tais como :
" de quando chegou a Breslau, na Polônia, e encontrou a casa de sua mãe em ruínas "
" de quando teve que deixar para trás o violino que havia prometido trazer a Erica "
" da mãe e filha, alemães, que famintas, e sem terem nada para comer, se escondiam nos arbustos na beira da linha do trem, na esperança de recolher algum pedaço de sanduíche atirado por soldados "
" de como se escondia abaixo dos cadáveres nas trincheiras, para não ser baleado"
" de como usava a própria urina para curar seus ferimentos"
" de como esperava a morte a cada bombardeio "
" de como arriscou a vida, escondendo a sua aliança embaixo da língua, numa revista quando o prenderam nos campos de concentração na Rússia "
10 anos de um homem que nunca quis ser herói, sua vitória foi sobreviver para poder voltar para sua família.
Logo apos as primeiras semanas, os traumas e problemas de saúde ficaram evidentes. Ele brigava ao ver cascas de batatas sendo jogadas fora, pois foram a base da sua alimentação por anos. Se encolhia nos cantos da casa, ou embaixo dos móveis, quando ouvia algum barulho de avião ou fogos de artifícios. Estava também desnutrido, tinha frequentes pesadelos e dormir não era tarefa fácil.
Apos algum tempo, com apoio de médicos, amigos e familiares, ele retornou ao trabalho numa gráfica, mas o convívio familiar ainda era muito difícil. A vida conjugal nunca mais foi a mesma. Carlota via seus sonhos, de voltar a Europa, morrerem e ela se tornou uma pessoa triste e calada. O relacionamento entre ele e Ruth também era distante, e ela via em Werner a figura de seu verdadeiro pai.
Mas Frederico encontrava apoio em Erica e na família de Werner e Mercedes, que sempre o apoiavam e o enchiam de carinho.
 
O contato, com os poucos parentes sobreviventes na Alemanha, era feito por cartas, que mostravam a triste realidade de reconstruir um pais do zero.
 
 
 
 

quinta-feira, 13 de maio de 2010

10 anos de ausência

Logo nos primeiros meses após a partida de Frederico, sua família percebeu que a viagem de férias seria bem mais longa do que o esperado. A declaração de guerra mundial trouxe um sentimento enorme de desespero, tristeza e desamparo. Todos os dias buscavam por noticias e alimentavam a esperança do retorno do pai.

Ficou claro a todos, que as economias não seriam o bastante para mante-los por muito tempo, assim Wener e Erica, agora já formados, foram trabalhar.

Werner, estudante de contabilidade, conseguiu emprego na Siemens, onde sua fluência em alemão era muito considerada e nunca mais deixou a empresa.
Erica, entrou como aprendiz numa grande oficina de costura, a tradicional Casa Cisne e só saiu de la como contra mestre chefe.
Ruth, ainda com 9 anos, seguia com seus estudos e via na figura de Werner seu verdadeiro pai.

Muitos anos se passaram e a esperança de rever o pai, desaparecera.




Werner conheceu Mercedes.

Filha do meio de uma família de imigrantes espanhóis, ela era uma moça instruída e sua presença era notada facilmente. O relacionamento tornou-se mais sério e ambos resolveram não mais esperar pela volta de Frederico e marcaram casamento.





A família ainda participava de reuniões e festas da comunidade alemã, onde Erica conheceu vários rapazes e dentre eles, um em particular, que propôs namoro.

Nessa mesma época, a jovem Erica, mantinha uma rotina pesada de trabalho com poucas paradas para  descanso, quando realizava rápidos lanches na padaria vizinha. Foi numa dessas tardes, que ela conheceu Jayme.

Apesar das diferenças sociais e educacionais entre os dois e da oposição da família dela, o namoro se concretizou. Ela sentia que tinha nascido para estar ao lado dele e nada iria separa-los. Jayme, por sua vez, via nitidamente todas essas diferenças e por isso sentia um ciumes doentio dela. Loira, instruída, independente, sua presença se destacava ao lado dele. Muitas vezes se sentiu humilhado pela família e dela, que o classificavam como inferior e não merecedor do amor de Erica.

Em meados de 1950, num dia normal de trabalho na oficina, Erica presenciou algo que jamais esqueceria em sua vida.
Uma funcionaria, que até então era vista como qualquer outra empregada normal, fez com que todas as máquinas parecem de trabalharem, apenas usando seus poderes mentais.  Nesse momento profetizou algumas frases para algumas pessoas e se voltou para Erica e disse " ...a meia noite, minha máquina irá até sua casa....." . Após o incidente a moça perdeu os sentidos e todos ficaram chocados com o ocorrido.

Naquela noite, uma chuva torrencial lavava toda a cidade, mas mesmo assim, perto das 12 da noite, um mensageiro chamava insistentemente a porta.
Assustados, mas curiosos quanto a carta, todos ficaram perplexos quando leram que Frederico estava vivo e voltaria para casa, após 10 anos de ausência.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Campo de Batalha

Em meados de 1939, comovido com o estado de saúde da mãe, já bem idosa, Frederico decide ir a Alemanha.
Contrariando todos os amigos e familiares, que achavam uma loucura a viagem num momento tão conturbado na Europa, ele embarca para aquela que seria uma prova de força e subrevivência para toda a sua família.

Logo após a chegada de Frederico, houve a invasão da Polónia pela Alemanha e ele pode ver que havia cometido um grave erro, que não seria fácil regressar a sua nova pátria e família. O violino que prometera a Erica, ficou pelo caminho. A aliança, escondida em baixo da linha, foi a única coisa que o acompanhou. A casa da mãe foi bombardeada e ele capturado pelo exercito alemão que o colocou em linha de frente.

Nunca havia segurado em uma arma em sua vida e tampouco sabia atirar. O primeiro tiro de fuzil resultou no arremesso da arma para trás e o usual "coice" no ombro de Frederico. A todo momento ele via o rosto do filho nos inimigos e rapidamente atirava para o alto.
Ele sabia que seria totalmente possível disso acontecer, já que Werner estava com 20 anos e o Brasil era da Base Inimiga da Alemanha. Não sei por quanto tempo ele sobreviveu na linha de frente ate ser capturado pelo exercito russo, mas foi tempo suficiente para presenciar os horrores da guerra e obter traumas que o acompanharam ate os fins dos seus dias.

A vida no campo de prisioneiros era terrível. Viveu por muito tempo comendo casca de batatas e a misera ração dada. Ouvia noticias vagas, histórias de vitórias e derrotas de ambos os lados, conheceu muita gente, fez amizades que ficaram perdidas em sua memória e buscava forças para sobreviver e voltar finalmente para sua amada família.

terça-feira, 11 de maio de 2010

A espera de um milagre

Quando criei o blog, pensei em postar em ordem cronológica dos fatos, mas não posso deixar passar o que esta me acontecendo nesses últimos dias e correr o risco de perder toda a emoção do momento.

Bem, vamos aos fatos.

As vésperas do Dia das Mães, mais precisamente a 5 dias atrás, estava eu conversando sobre como era iniciar um novo ciclo em minha vida. Fisicamente convencida que deixara para trás minha vida fértil, comentava sobre planos profissionais e de aposentadoria.

Foi quando comecei a sentir algo se movendo dentro de mim, algo estranho, não era dor, nem cólica, nem gases, era um movimento. Encarei como muscular e não dei atenção. Mas, o movimento se intensificou na manha do dia seguinte e eu precisava descobrir o que era. Nessa manha estava ajudando minha amiga Marcella, gravida de 3 meses, com sua mudança e ela também pode ver e sentir o que tentava descrever.

Nossas mãos e olhos nos diziam o que a mente e a razão tentavam negar. Parecia um movimento de gravidez. Ela me indicou um teste, um desses de farmácia e ficamos perplexas quando vimos POSITIVO. Dois dias depois, o médico também confirmou e deixamos o consultório, com inúmeras solicitacoes de exames e super, super, surpresos e felizes. Wagner e eu, estávamos grávidos.

Mas na mesma tarde, vimos nossa alegria se desfazer e a fé e esperança tomarem conta de nossos coracoes. Os médicos não conseguiram ouvir o coraçãozinho do bebe. Nos disseram para refazermos o ultrasom em 10 dias, porque o bebe era muito pequeno, de 5 a 6 semanas e talvez por isso não conseguiram identificar o ruído. Mas, também poderia ser que o bebe não mais estivesse vivo. O que ficou mesmo comprovado é que os movimentos sentidos e vistos por mim e por minha amiga, "jamais" poderiam ser do meu bebe, visto que ele era muito pequeno.

Saímos de la arrasados, mas a espera de um milagre. Corremos a Internet e nos agarramos a fatos e historias de pessoas que também passaram pelo mesmo problema e conseguiram ter uma gravidez saudável.

No domingo, os amigos Sandro e Micheli, tinham nos convidado para festejar o Dia das Mães numa igreja próxima, e acreditei que era uma otima oportunidade para agradecer e pedir por tudo que nos tinha acontecido nos últimos 3 dias. Foi muito duro estar ali e sentir toda aquela emoção, ainda mais quando o pastor disse que os trabalhos e preces da semana seriam para o tema "gravidez" .

Tenho 45 anos, e a precisos 45 anos atrás minha mãe me adoptou, quando ela também tinha 45 anos. Nos temos os mesmos nomes, somos homónimos. Só mais outra coincidencia?

Hoje, faz 4 dias que realizei o ultrason e fui surpreendida por um pouco de sangue, pela manha e minhas esperanças estão se desfazendo.

Não entendo porque Deus, ou o universo, ou seja la que forca maior foi, gastaria energia para me dar um bonito sinal, suficiente para me fazer mover e descobrir algo tão maravilhoso para depois tirar em poucos dias. Então, porque não me deixar na ignorância, pensando na minha nova fase de vida?

Acredito que tudo na vida seja um aprendizado e que eu tinha que sentir o peso e o valor da perda.

Essa semana devo voltar ao hospital para refazer o ultrasom e quem sabe os procedimentos de retirada do bebe. Não esta sendo fácil esses últimos dias, onde nos pudemos sentir os doces momentos de sermos mais uma vez pais e os tristes momentos de uma provável perda.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Do campo para a cidade

Dos 12 filhos de Joaquim, o jovem Jayme era o único filho que não gostava da vida no campo. Comunicativo, vaidoso e mulherengo, vivia sonhando com a vida na cidade grande.

Em 1940, já agora com 21 anos, decide que já era hora de colocar seus planos em prática. Despede-se dos pais e irmãos e embarca no ónibus para São Paulo, com 1 mala, dinheiro para se manter por um par de meses e muitos, muitos sonhos. Os pais desapontados com a escolha do filho, apostam no breve retorno.

Ao desembarcar, Jayme se vê encantado com o dinamismo e a agitação da cidade grande. Bondes, carros, pessoas por todos os lados, ele estava extasiado. Logo encontrou uma pensão, que passou a ser o seu novo lar.

Apesar da pouca educação, Jayme era uma pessoa que se destacava pela força de vontade de trabalhar e aprender. Cada dia, tinha mais e mais certeza que seu lugar era alí, na cidade, no mundo dos negócios.

Seu primeiro emprego foi numa padaria, trabalhava como auxiliar de padeiro. Cada dia era um aprendizado, aos poucos o dono percebeu que aquele jovem, tinha tino para os negócios e o chamava para negociar preços com fornecedores. Assim, pouco a pouco, foi aprendendo a dinâmica de como administrar.

O trabalho começava cedo, mas era bem mais fácil comparado ao da fazenda.

Nas horas de descanso costumava andar pelas ruas do centro, pela Rua Direita, Rua Santo Bento, Barão de Itapetininga. As vezes parava a porta da Leiteria Campo Belo ou da Confeitaria Vienense, somente para ver a sofisticação das mocas tomando chá, com seus casacos, chapéus e luvas.

A noite a cidade se tornava sinonimo de paquera, onde as mulheres faziam o percurso pelas calçadas da Barão de Itapetininga, Av. Ipiranga, 24 de Maio, D.José de Barros, e os homens ficavam postados no meio fio olhando o desfile, e esperando ser o escolhido para uma sessão de cinema. Quem ficava no trecho da Confeitaria Vienense tinha o privilégio de ficar ouvindo as músicas , geralmente uma orquestra de cordas, com um piano bem executado.

O dia-a-dia em Sao Paulo ( 1915 - 1940 )

Frederico encontrou trabalho assim que chegou, numa grande gráfica, mas nunca abandonou a paixão pelo desenho.

Tiveram 3 filhos. Em 1919 nasceu Werner, em 1920 nasceu Erica e em 1931 Ruth.

Ele tentava dar o melhor padrão de vida para a familia, interagindo bem tanto com a comunidade alemã como com a local.









Os filhos estudavam no Colégio Benjamim Constant, na Vila Mariana, antigo Colégio Alemão, onde foram alfabetizados em português e alemão.





Participavam de festas e eventos da comunidade e mantinham uma vida social ativa.

Frederico sempre considerou importante a prática de esportes e associou-se ao Clube de Regatas Tiete, zona centro norte da cidade, as margens do rio Tiete.
Lá ele pode desenvolver sua outra paixao: a natação. Teve a oportunidade de participar de diversas competições de natação no próprio rio Tiete, hoje completamente poluído, no centro da cidade de São Paulo.



De todos os filhos, Erica foi a que mais destaque teve na carreira esportiva. Ela chegou a representar o clube, ganhando muitas medalhes no arremesso de dardo e peso. Realmente ela era a estrela da familia, sendo suas conquistas notificadas em jornais e revistas da época.




Apesar de Frederico tentar manter sua vida semelhante a que tinham na Alemanha, era visivel a dificuldade de adaptação de Charlotte.

Tímida e falando o português com extrema dificuldade, Charlotte mantinha amizades com algumas familias alemães e poucos vizinhos.

A saudade dos pais, parentes e da vida cosmopolita, era enorme. Talvez pensasse secretamente em voltar, quando a Europa já não fosse um lugar tão inseguro.

quinta-feira, 25 de março de 2010

Comecando uma nova vida.

Tudo leva a crer que os recursos financeiros, trazidos por Frederico, eram mais do que suficientes para dar uma vida confortável a sua família, na São Paulo do inicio do século XX.

Assim que chegaram, ele comprou casa na Vila Mariana, bairro novo, onde a maioria dos moradores eram imigrantes europeus, como eles.

O bairro era provido de luz elétrica, mas o abastecimento de água, demorou alguns anos para chegar, sendo utilizado sistema próprio de água e esgoto, através de poços.


A Vila Mariana já era uma importante região pois ligava o centro de São Paulo com Santo Amaro.

Era servido de bondes elétricos abertos, que faziam a ligação entre o bairro e o centro de São Paulo.

A casa tinha 2 quartos grandes, sala, cozinha, sendo que o banheiro e a lavanderia ficavam na parte externa da casa, como era de costume na época.

O lote comprado era grande, fazia divisa com uma chácara, onde Charlotte podia comprar leite fresco, queijos, frutas e verduras.

Cuidar do jardim não era problema, mas o mato e árvores facilmente dominaram quase o restante da propriedade.

A rua não era asfaltada e a iluminação precária.